Foto: Reuters / Sérgio Moraes

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Videla assume culpa por crimes da ditadura

Para analistas, ex-general argentino, julgado por 31 casos de assassinato e 5 de tortura, tenta eximir de responsabilidade 700 militares e policiais

Ariel Palacios - O Estado de S.Paulo

CORRESPONDENTE / BUENOS AIRES

O ex-general argentino Jorge Rafael Videla, autor do golpe militar que em 1976 instaurou a mais sanguinária ditadura da História da América do Sul, assumiu ontem a responsabilidade pelos crimes cometidos, rompendo seu silêncio desde a volta da democracia, em 1983.

"Assumo minha responsabilidade na guerra interna. Meus subordinados limitaram-se a cumprir minhas ordens", declarou ontem em um tribunal. Videla está sendo julgado desde a semana passada em Córdoba pela acusação de ser o responsável direto de 31 assassinatos e 5 torturas ocorridos nos primeiros 9 meses da ditadura nessa província.

O ex-general, de 84 anos, é considerado o "arquiteto" do sistema de repressão aplicado pela ditadura, que torturou e assassinou 30 mil civis, além de sequestrar 500 bebês, filhos de desaparecidas políticas.

Videla justificou os assassinatos. "Era uma guerra interna. Defendo tudo o que o Exército fez", afirmou, referindo-se à suposta atuação da guerrilha durante seu governo. No entanto, os grupos guerrilheiros havia sido praticamente debelados em 1975, no final do governo de Isabelita Perón, um ano antes do golpe.

Analistas afirmaram que, com suas declarações, Videla tenta eximir de culpa os 700 militares e policiais que estão sendo processados na Justiça por graves violações dos direitos humanos durante a ditadura.

Videla havia indicado que admitia sua culpa em 2001, quando, em declarações aos jornalistas María Seoane e Vicente Muleiro, autores de O Ditador, sua biografia não autorizada, disse que tinha conhecimento das torturas e mortes: "Eu sabia tudo o que acontecia, estava acima de todos!"

Em 1985, durante o julgamento das juntas militares - chamado de "Nuremberg argentino" - o ex-general manteve silêncio absoluto. "Videla ficava lendo um livro religioso. Parecia estar em outro planeta", disse ao Estado o ex-promotor Julio Strassera.

Na ocasião, o ex-ditador foi condenado à prisão perpétua. Mas, em 1990 foi anistiado pelo presidente Carlos Menem. Em 1998, organismos de defesa dos direitos humanos driblaram as leis de perdão aos militares e conseguiram a detenção de Videla pelos sequestro de crianças, crime que não havia sido incluído no indulto presidencial.

Em 2007, com a anulação dos indultos, declarados inconstitucionais, Videla tornou-se alvo de vários processos relativos a assassinatos. O atual julgamento, o primeiro público e oral de Videla desde 1985, durará seis meses. "Ninguém pode ser julgado duas vezes pelo mesmo processo", argumentou o ex-general ontem.

Para lembrar

Em março de 1976, Isabelita Perón foi deposta por um golpe militar. O general Jorge Rafael Videla assumiu o poder, fechou o Congresso dissolveu os partidos políticos e iniciou uma "guerra suja" contra os oposicionistas. Milhares de pessoas foram feitas prisioneiras, perseguidas, torturadas e assassinadas. Até o fim da ditadura, em 1983, desapareceram mais de 30 mil pessoas. As mães dos "desaparecidos" faziam manifestações semanais, exigindo saber o paradeiro dos filhos.

Fonte: Estadão

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